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VIDA DUPLA

Vivo uma paixão muito séria com alguém casado que se mudou para a minha casa, mas que continua por humanidade e bom carácter a apoiar a ex-mulher em tudo. Continuam a ter uma vida de fachada porque os pais dele não podem saber (sao velhos) de nada. Isto implica que todos os encontros familiares, com amigos, aniversários, festas diversas, tudo se mantém igual ao que era dantes na vida dele. Portanto há muitos dias em que não está comigo, voltando sempre, porém, cheio de saudade e desejo de me ver. Somos muito felizes e em tudo estamos bem. Há anos que nos esperávamos um ao outro e só depois dos filhos casados e de eu ter enviuvado se tornou possível o nosso encontro, que dura há dois anos e meio. Aquilo que me parecia fácil começa agora a pesar-me. Não gostaria que me fizessem o que eu, afinal, estou a fazer - tirar alguém do seu meio e da sua vida, rotineira embora, mas vida aparentemente''normal''como há muitas por aí... Hesito entre manter a relação e acabar com grande desgosto meu e dele. Acresce uma terrivel doença dele diagnosticada há pouco e que me tira a hipótese de repor por falta de coragem as coisas nestes termos: como não gosto de viver 'assim', segue a tua vida. Aliás, já o tentei e o sofrimento de ambos não se descreve. Voltamos sempre aos braços um do outro, felizes e sinceros. No presente os apelos de que eu sou a 'vida' e que a minha falta é o desespero têm-me feito manter o que na minha geração sempre se chamou 'vida dupla'. O remorso e aquele sentimento de culpa, a sensação de que do lado dele ninguém tem noção deste amor e felicidade que ele vive comigo, andam a fazer-me sofrer. Temos ambos cerca de 60 anos e a familia (mulher e filhos) dele sabe da situação. Mas eu questiono-me muito sobre o meu papel. O meu filho e meus familiares aceitam bem porque já perceberam a situação e a sinceridade que há nela. Mas eu sofro bastante e todos os dias me atormento. Apesar de tudo, eu sei que aquela mulher espera sempre o regresso do marido!! Pode ajudar-me Sr.ª Doutora?
A.


Expressou com grande clareza as emoções por que tem passado. Deduzo que não tenha sido, nem esteja a ser, um processo fácil.

Também não posso deixar de assinalar que este tipo de situações - a que chama de vida dupla - são muito mais frequentes do que se possa imaginar. Independentemente da idade das pessoas envolvidas, nunca é algo que se revele orgulhosamente, pelo que, na maior parte dos casos, as pessoas sofrem em silêncio. Louvo, por isso, o facto de se sentir compreendida pelos seus filhos. Acredite que é um grande apoio.

Não posso concordar consigo quando diz que está a "tirar alguém do seu meio e da sua vida". Na verdade, não está a tirar ninguém da sua vida. Cada um faz as suas escolhas, e o seu companheiro também está a fazer a sua. Escolheu ficar consigo, ainda que nestas circunstâncias. Importa saber se a Senhora está feliz com a escolha que fez. Terá passado com toda a certeza por muitas angústias ao longo de todo o tempo e saberá melhor do que ninguém que não há alternativas perfeitas. Cada caminho à sua disposição implica perdas e ganhos e é desse equilíbrio que pode resultar a sua decisão.

Neste processo é fundamental que dê voz às suas próprias necessidades e aos seus sentimentos. É certo que aos olhos da família do seu companheiro a Senhora é vista como a fonte dos problemas. Mas essa perspectiva é baseada na dor provocada pelo fim daquele casamento. O distanciamento permite ver tudo com maior discernimento. E a verdade é que não existe nenhum culpado.

Quanto maior for a honestidade e a transparência, maior será a serenidade de todos.