Desde há algum tempo que estou preocupado com uma situação. Penso que sofro de ansiedade, umas vezes de uma forma mais extrema, outras vezes menos extrema. É o seguinte: fiz uma cirurgia de extracção de um ciso incluso há cerca de 10 anos. Até aí nunca tive grandes sintomas de ansiedade. Acontece que essa cirurgia correu bastante mal e o dentista não conseguiu extrair o dente, por este ter subido para a cavidade nasal. A partir daí o médico dentista informou-me que já não podia mexer mais e que já não era do foro dele, e que teria que procurar, mais tarde, um ortodontologista, caso o dente viesse a ter alguma actividade prejudicial. A partir do momento em que saí do consultório, nesse mesmo dia, e depois nos dias seguintes, tive uma angústia e ansiedade tão grandes que não sei descrever, por preocupação do que poderia acontecer ao tal dente do ciso não extraído, se iria ter problemas de saúde graves no futuro por causa disso ou não, enfim... foram noites de insónia total, dias inteiros em que não estava bem em lado nenhum, suava em demasia, quase que entrava em pânico. Vou apenas descrever muito rapidamente o que sentia: durante o dia a minha cabeça estava a mil à hora, ou seja, comecei a sentir uma tremenda necessidade de combinar saídas com os meus amigos, porque em casa não me sentia nada bem. Até receber a resposta deles, sentia uma angústia tremenda e uma ansiedade indescritível, com medo de eles não poderem. Se a resposta fosse positiva para um ou dois deles, mas houvesse quem não pudesse ir, sentia logo a ansiedade ainda mais aumentada, porque pensava logo "então mas agora quando vou ver o amigo Y? Onde vai estar ele? Porque é que não pode?", e isso fazia-me confusão, não ter certezas em relação à "minha agenda", uma ansiedade terrível. Até lá em casa tinha necessidade de saber tudo ao pormenor, andava angustiado. Mesmo quando estava com os meus amigos, que era o meu objectivo diário, constante (como se fosse um escape para mim - a ideia de não estar com eles por impossibilidade deles ou minha era para mim uma angústia impossível de descrever), não estava bem, porque depois pensava "aqui neste bar eu até gosto, mas gostava de ter ido a outro, ou passear a outro lado, etc". Ou seja, tinha sempre a cabeça a mil e com uma ansiedade indescritível. Até quando chegava a casa, se não estivesse ninguém, eu entrava em angústia, eu que antes desse primeiro episódio, sempre adorei estar sozinho em casa, por estar à vontade e fazer o que bem quero e me apetece. Depois tudo passou e fiquei novamente "normal". O 2.º episódio aconteceu quando cheguei ao último dia de férias: nessa noite recomeçaram exactamente os mesmos sintomas e ideias (o dente do ciso já nem era preocupação). Agora o 3.º episódio, embora menos intenso, ocorreu na semana passada, quando ia fazer exame nacional para tentar acesso à faculdade (algo que sempre quis e fui adiando): deixei tudo para a última hora até que a minha namorada, que foi quem me impulsionou a ir para a faculdade por saber que sempre quis ter um curso superior, me disse que parecia que eu estava a enganar toda a gente e a mim próprio, porque digo que vou, ela apoia, e depois acabo por não estudar nada e deixar tudo para o próximo ano lectivo (já lá vão 4 anos que lhe prometo que vou para a faculdade e nada...). Bum! Outra vez os mesmos sintomas de angústia, não estou bem em lado nenhum, e ao mesmo tempo quero estar com toda a gente, e entro num processo de angústia terrível se souber que não posso combinar com os meus amigos, porque tenho já coisas combinadas com a minha namorada por exemplo. Será que esses pensamentos assim tão recorrentes são um sinal de transtorno obsessivo-compulsivo, ou trata-se de ansiedade extrema? São episódios que passam com alguma rapidez e levo muitos anos sem os ter. Quando não os tenho sinto-me lindamente, sem angústia e ansiedade, tirando algumas preocupações que são o normal do dia-a-dia de cada um de nós.
C.
As diferentes situações que descreveu são condizentes com níveis muito elevados de ansiedade. Estas crises de ansiedade são muito mais frequentes do que possa imaginar e são-no ainda mais na população masculina. Estão normalmente associadas à dificuldade em vivenciar e gerir emoções negativas como a tristeza e traduzem-se no medo exacerbado de não conseguir controlar alguma coisa. Repare que, sendo o primeiro episódio que descreveu claramente preocupante, seria legítimo que sentisse medo. Mas o medo não tem de ser algo que nos domina e descontrola totalmente. Pelo contrário, o medo protege-nos, impede-nos de cometer erros graves ou de corrermos riscos desnecessários. O facto de ter sido confrontado com uma situação alarmante com o dente do ciso deveria conduzi-lo aos passos necessários para garantir a sua saúde. É possível que o médico que o atendeu não tenha sido muito claro em relação aos procedimentos que deveria implementar e, por algum motivo relacionado com vulnerabilidades antigas, o leitor sentiu-se muito inseguro e emocionalmente bloqueado.
Mais tarde o medo de não controlar a realidade à sua volta traduziu-se nas saídas com os amigos. De facto, ninguém consegue controlar tudo, todos os procedimentos, mas isso não implica que vivamos assustados. Creio que naquela altura ser-lhe-ia extremamente difícil estar sozinho porque isso implicaria uma angústia e uma sensação de desamparo insuportáveis. Nesses momentos, o ideal é telefonar a alguém, falar sobre o que está a sentir e pedir ajuda para que a situação seja desdramatizada. Mas estamos ainda a falar apenas da gestão do problema. Identificar a sua origem implica provavelmente uma análise muito mais cuidada e morosa.
O medo de, mais uma vez, não controlar tudo ter-se-á manifestado novamente nos últimos anos a propósito da sua entrada para a faculdade. É fácil perceber que o leitor depende maioritariamente de si mesmo, mas isso não significa que controle tudo e muito menos que, ao dar o seu melhor, estudando afincadamente, não se exponha à rejeição que resultaria de não ser admitido. Pelo que me é dado a perceber, os seus medos estarão a impedi-lo de concretizar alguns sonhos, o que, sendo muito frequente, como referi antes, não deixa de ser uma fonte de angústia.
Não faz sentido escamotear o problema, mesmo que este não esteja presente em todas as áreas da sua vida. Competir-lhe-á discernir sobre o que quer para si bem como sobre aquilo que é capaz de suportar em termos da gestão da ansiedade e do comprometimento do seu bem-estar.