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FINGIR QUE ESTÁ TUDO BEM

Sou tímida desde que me lembro. Quando era pequena era tímida mas sociável e fazia amigos com facilidade até porque me tornava engraçada com aquele jeito. Com vinte, quase vinte e um anos sou, diria eu, tornei-me patologicamente tímida. Impede-me de fazer amigos e perdi os que tinha uma vez que entrei para a faculdade e a situação tornou-se mais difícil em termos de convívio e acabou por aparecer um constrangimento que faz com que vire a cara ao lado quando vejo alguém perto. Tenho noção de como ajo e como sou mas quando estou na situação o cérebro pára ajo sempre da mesma maneira. Na faculdade as coisas começaram a correr mal porque sem amigos, poucos conhecidos e uma sensação de que todos reparam que não falo com quase ninguém, etc., é desmotivador e falto tanto quanto posso. Juntando à timidez estou com um problema de ter um namorado de quem gosto como amigo mas não consigo dizer-lhe. É insuportavel pensar em magoar alguém, não sou capaz de lhe dizer e claro que tenho medo de ficar mais isolada prque só convivo com a família e com ele. Como se não bastasse, estou com comportamentos compulsivos do género de tocar nas coisas varias vezes... (é a primeira vez que escrevo ou falo sobre isto e estou com um nó no estomago...). Não aparento alguém com sentimentos depressivos nem nada disso, sou alegre junto da minha família, falo muito, rio sempre e faço um esforço enorme por manter a boa disposição de quem me rodeia. Já no passado tive sintomas de anorexia que passaram pela perda de peso, pesagem da comida, exercício fisico que chegava aos oitocentos abdominais por dia, hipersensibilidade ao frio, mas passou da mesma maneira que começou, sem precisar de ir ao médico. Digo isto a propósito dos comportamentos compulsivos que se calhar já vêm dessa época. Dantes via-os como um tipo de superstição mas depois percebi quando vi na televisão uma descrição daquilo que eu fazia. Não melhorou por ter noção, até piorou e o que me motiva (mais uma vez é a primeira vez que falo disso) é proteger os meus pais. Eu não me sinto alguém com depressão, não quero tomar calmantes, não sinto a necessidade deles mas quando escrevo sobre estas coisas tenho noção do que se passa e fico com medo de estar deprimida mas sinceramente não me quero entregar a essa sensação porque apesar de tudo eu combato isso, pelo menos à superfície, com boa disposição e às vezes penso que quanto mais alegre estou menos bem estou por dentro. Sou muito sensível aos problemas das pessoas que amo e sentir que estão tristes deixa-me mal - pareço uma antena que capta as emoções dos outros. Enfim, a descrição assim parece muito má mas mesmo sentindo cada uma dessas coisas no todo não estou arrasada nem nada que se pareça - tenho episodios de tristeza e nostalgia mas facilmente alguém de que gosto me pode fazer ficar bem.
S.

Mais importante do que dar um nome ao seu problema, é, do meu ponto de vista, reconhecer o seu impacto. Ou seja, o rótulo é só isso mesmo, um rótulo. No entanto, existem dificuldades a que fez referência que estão a comprometer o seu bem-estar e a realização de tarefas quotidianas consideradas banais. Sem querer fazer diagnóstios abusivos, devo alertá-la para a necessidade de estar demasiado centrada nas expectativas das pessoas que estão à sua volta. Talvez seja a hora de dar voz às suas emoções. Partilhar a sua angústia e as suas preocupações com os seus pais, com o seu namorado ou com qualquer outra pessoa de quem goste pode parecer-lhe assustador, mas é o caminho mais ajustado. Só assim permitirá que estas pessoas lidem consigo de forma ajustada e honesta. Por exemplo, ao não querer magoar o seu namorado, está a impedi-lo de ser verdadeiramente feliz ao lado de alguém que o ame. É certo que uma ruptura é quase sempre sinónimo de dor e sofrimento, mas estas emoções são temporárias e ajudam-nos a crescer.

Fingir que está tudo bem é só mais uma forma de se convencer de que está a controlar as suas dificuldades. A prazo, essa ilusão poderá voltar a dar lugar a comportamentos disfuncionais, como a anorexia por que já passou. É isso que acontece quando as nossas emoções são contidas, em vez de serem assumidas e geridas de forma inteligente. Só se estiver disposta a aceitar-se como é e a dar-se a conhecer como é, conseguirá lidar com as pessoas com quem convive e fazer amigos que tanta falta lhe fazem.

À primeira vista este pode parecer-lhe um desafio insuportável, mas posso garantir-lhe que existem muitas jovens com o mesmo padrão de dificuldades e que é possível revertê-lo. Sugiro que fale com um psicólogo experiente e/ou com o seu médico de família. Mesmo que não esteja com vontade de fazer nenhuma medicação neste momento, existe sempre a possibilidade de ser ajudada através da psicoterapia.